MEMÓRIAS
Abri o blog hoje, depois de um dia extremamente difícil, com excelentes notícias!!!!

Por conta do post no blog da irmã de uma colega minha --interessantíssimo, aliás, sobre como é viver e trabalhar em NY--, que remeteu aos contos que aqui publiquei, recebi, em menos de 24h, mais de 40 acessos!!!!!

Muito obrigada por lerem o que escrevo!!!
MEMÓRIAS
SUGESTÃO.1.: LEIA O PRIMEIRO CONTO ANTES, OU NÃO...

Valentina. Valentina Rosa Marques. VR. Valentina Maques. VM. Valentina Rosa. São muitas de mim em uma só. Assim, saímos sozinhas, acompanhadas apenas de nós mesmas. No cinema, Valentina. No restaurante, Valentina Rosa. Assinando uma história, VR. Tentando vender uma história, Valentina Rosa Marques. Mas, também, poderia ser Valentina Rosa Rosa. Ou, apenas Rosa.

Mas não sou uma apenas para cada evento. Sou uma para cada cidade e, definitivamente, uma para cada um. No Rio, sou tímida e deslumbrada com tudo e todos a minha volta. Ganhei Gustavo. Em Curitiba, sou delicada e elegante. Ganhei Romeu. Em São Luis sou arrojada, mas um tanto inerte; contagiada pelo som que inunda a cidade, ganhei Pedro... e Caio, também.

Em Barcelona, sou independente e audaz. Ganhei Ricardo, mas tive que mostrar a ele que ele deveria era tentar ganhar Pablo. Em Paris, sofisticada, fútil e intelectual. Ganhei Maurice. E o tive por um ano inteiro sob a luz rosa dos meus dias. Em Havana, marxista e revolucionária. Ganhei Fidel –que não era o Castro... e nem casto. Em Porto Alegre, sou todas as outras: tímida e arrojada; delicada e revolucionária; fútil e marxista; elegante, intelectual e audaz; sofisticada, um tanto inerte... mas, sobretudo, independente. Ou, simplesmente, Rosa.

Da mesma forma que somos muitas, precisamos de muitos que compreendam cada uma de nós. Assim, muitos me apresentaram seus mundos. Muitos falsearam seus mundos. Em alguns mundos, apenas fui uma visitante mais ou menos discreta. Mas, de alguns mundos gostei. E fiquei. Fiquei só até que uma ânsia que não sei de onde vem, uma inquietação, um desespero, uma inadequação me atingisse e me impedisse de continuar naquele mundo que até então parecia o melhor. As outras que moram em mim começam a brigar por seu espaço aos gritos dentro da minha mente. E quando seus gritos fazem eco em meu coração, percebo que ele não passa de um órgão vazio. Sem móveis. Como que uma casa abandonada há anos. Talvez haja somente uma cadeira com um vestido hoje velho –mas que, há poucos dias, era novinho e eu não tirava do corpo por nada. Assim começa a minha procura por novos mundos. Novos mundos que, por algum tempo –ou por muito tempo–, preencham esse órgão vazio com suas histórias, seus desejos, sua cultura e suas ambições.

Da última vez que os gritos das muitas que moram em mim ecoaram em meu coração, deixei Paris. Deixei Maurice. A luz rosa, também deixei... em busca de outra Rosa. Voltei a Porto Alegre e senti que era hora de voltar a ser todas em uma só e, não mais, apenas a sombra de nós todas. E, mais uma vez, sai de cena Valentina Rosa, para dar lugar somente a Rosa.

Em Porto Alegre, retomei a faculdade de Letras tentando me formar ainda naquele semestre –consegui. Como é estranho lembrar essas coisas. Hoje não consigo me imaginar sem minha profissão, meus prazos, meus artigos, meus contos. Parece que isso é muito do que eu sou. Então o que eu era antes de ser isso? Bom... acho que isso é umas das coisas que estou tentando descobrir. Enfim... continuo, então.

Foi complicado retomar a faculdade depois de dois anos viajando por aí. Na verdade, não só a faculdade, mas a vida mesmo. Foram muitas semanas sendo Valentina Rosa Marques e tentando vender minhas histórias. Eu não queria ser VR, queria ser apenas Rosa. Afinal, eu abandonei a luz rosa por Rosa. Até que, após muita insistência, um professor gostou de uma história que escrevi e mostrou para um amigo. Aí, antes mesmo de terminar a faculdade, começaram meus prazos. Os prazos que estabelecia –e estabeleço– a mim mesma para a duração das coisas. Prazos fatais.

Um dia, cansada um pouco de tantos prazos e de tanta fatalidade, aceitei o convite de alguns colegas e fui para um bar próximo ao centro da cidade. Para mim era totalmente contramão. Na época eu morava na zona sul –não que eu gostasse, mas era mais barato. Cheguei lá e todos queriam que eu contasse sobre as viagens, os lugares e os mundos que conheci. Não podia dizer que me havia cansado de tantos mundos. Não podia dizer que era [sou] muitas em uma só. Não podia dizer que ouvia gritos constantes e cada vez mais altos em minha mente. Não podia dizer que para mim todos os prazos eram fatais... e eles eram vários. O que iriam pensar de mim? Louca, certamente.

Assim, contei sobre a música de São Luis, as artes de Paris e a moda em Barcelona. Contei da dança e dos charutos de Cuba, dos trambiques do Rio e do frio de Curitiba. Contei da vontade de ir a Rússia. Da viagem à Grécia que não saiu. Mas não contei que a viagem não saiu porque os gritos começaram a fazer eco. Acho que, na verdade, eles nunca entenderam porque eu só falei o óbvio. Mas ouviram assim mesmo. Meio desinteressados e desapontados.

Uma hora cansei. Não podia contar o que mais importava: a impressão que tive. Não podia contar como tudo pareceu, porque, aí, eles descobririam que somos muitas em uma só. Mas, em meio a todo esse discurso improvisado, percebi ele. Ele sentado sozinho. Ele parecendo cansado de tudo. Ele me olhando. Ele. Lindo, alto, segurando um cigarro que não fumava e um copo de vinho que bebia. Então parei.

Sentei em sua mesa. Tomei do seu vinho e pedi um cigarro. Me deu. Achei engraçado o jeito que ele me olhava. Meio que com respeito por todos os lugares que eu conhecia. Meio que com admiração pelo discurso sem-graça que eu fiz. Só ele mesmo para achar que meu mundo tinha alguma coisa além de uma casa vazia. Só ele mesmo para achar que meu mundo existia. Mas eu gostava do jeito que ele me olhava.

O bar fechou. Ele morava perto. Não sei bem como, mas acabei tomando mais um vinho em sua casa. Era estranho o fato dele parecer me conhecer tanto, enquanto eu nada sabia sobre ele. Queria que ele me mostrasse seu mundo. Afinal, precisava de móveis para minha casa vazia. E ela era tão grande... Mas ele não respondia. E o que dizia não fazia sentido.

- Ah... então tu faz jornalismo?
- Sim.
- Trabalha com o que?
- Correção gramatical.
- E o que jornalismo tem a ver com isso?
- Nada.

Tomei mais um vinho e, exausta de tanto tentar conhecer o mundo dele, dormi. A seu lado na cama. No dia seguinte acordei. A seu lado na cama. Aqueles olhos continuavam me olhando. Gostei. Ele realmente via um mundo em mim. Comecei a acreditar que esse mundo realmente existia. Aí... a Rosa ficou audaz, decidida. Não disse palavra, corri as mãos por seu rosto e pousei-as sobre seus olhos de um azul que eu achava que não existia. Não. Não podiam ser olhos de verdade. Não tive como não beijar aqueles olhos e depois aquela boca. Aquela mesma boca que não me dizia o que eu tanto ansiava saber. Que insistia em não me mostrar seu mundo.

Ele me dominava, talvez, sem perceber. Com seus olhos, seu sorriso, sua língua e suas mãos. E eu gostei. Por um tempo que pareceu muito tempo. Que pareceu o maior tempo. E que, pela primeira vez em tanto tempo, não era fatal. Por esse tempo ele conheceu mundo. Meu mundo de muitas em uma só. Parecia que ele também podia ouvir os gritos que eu escuto. Por esse tempo, os gritos não tiveram onde ecoar, pois a casa estava toda mobiliada. Cheia de armários, prateleiras, pufes e até tapetes –que, mesmo provocando minha alergia, estavam ali. E eu não me importei. Eu quis que ficassem. Só que não era a mobília dele. Era minha. Eu queria ele cada vez mais. Não sei se ele me queria. Mas sei que ele me entendia. Ou parecia entender. Nesse momento eu percebi que jamais lhe diria não. Mas ele nada pediu.

Eu levantei. Me vesti e saí de seu apartamento com frente para Redenção, deixando a porta entreaberta. Ele não disse palavra. Eu não disse palavra. E, assim, sem dizer palavra, eu apresentei meu mundo para ele. O mundo que eu só percebi que existia porque visto pelos olhos azuis dele. O mundo que eu só descobri quando ele me negou o dele. O mundo que era muito mais do que os gritos, muito mais que a mobília que outros levavam consigo quando partiam.

Agora, não dependia de mim. Não era mais eu quem decidia. Ele ficaria se quisesse. Mas ele não me seguiu. Não ficou. Me deu tudo sem dar nada de si. Uma sala cheia que continuou cheia mesmo sem ele. Os gritos viraram sussurros. Todas aquelas que vivem em mim andam quietas. Parece que respeitam mais Rosa do que a si mesmas. Porque Rosa tem algo que elas não têm: o mundo. Mas ele, ele continua sendo meu passado que não passa. Aquele que me deu o mundo. Aquele que me negou seu mundo. Aquele que complicou meu mundo.

Será que eu signifiquei algo no mudou dele? Será que ele se lembra do meu mundo? Não sei. E acho que nunca vou saber.

SUGESTÃO.2.: LEIA O TERCEIRO CONTO, OU NÃO...

MEMÓRIAS
Convescote. Nome antigo para piquenique. Mas piquenique não é um nome antigo também? Aliás, quem, hoje em dia, faz piquenique? Ou convescote? Pensei isso enquanto olhava pela janela do apartamento com frente para o parque. um casal caminhava em direção ao seu centro, com algumas sacolas e uma garrafa de vinho, além de toalhas e copos mal embrulhados. Nada como as cestas que vemos nos desenhos infantis. Pensei em Rosa.

Ao menos uma vez por mês eu penso em Rosa. No final de domingos. São dias com uma rotina própria, peculiar. Acordo num rompante de sonho interrompido, tentando lembrar algo que nunca aprendi. Fico na cama, fito o teto. Como que impedido de levantar enquanto minha memória não responder a esta busca. Quando consigo sair da cama, passo a manhã procurando por não-sei-quê. Procuro sem saber ao certo o que devo encontrar, mas sei que tenho que procurar. Não lembro o almoço. Esqueço o telefone. Não ouço a campainha. Não entro na internet. Fico inerte. E não por um motivo específico, mas simplesmente porque é assim que as coisas acontecem quando é dia de pensar em Rosa.

A tarde geralmente é de sol, mas teve uma vez que choveu granizo e mesmo assim eu pensei em Rosa. São tardes que passo em frente à janela, imóvel, parado, como que fora do mundo. Mas inquieto e tomado por um desejo que nada supre. Então, quando o sol começa a baixar, sinto chegando devagarzinho os pensamentos em Rosa. Sua imagem, pouco a pouco, vai-se tornando clara a minha frente. Abro uma garrafa de vinho –que já fica na geladeira sempre esperando por estes dias em que penso em Rosa. Acendo um cigarro, sento-me confortavelmente na cama e espero que qualquer coisa a qualquer instante leve meu pensamento à Rosa. Pronto! O convescote.

Conheci Rosa há alguns anos atrás em um bar da modinha da época. Ela era amiga de uns colegas da faculdade, tinha acabado de voltar da França e estava retomando os estudos de Letras, pretendendo se formar aquele semestre. Eu ainda precisei de mais dois anos. Aquele dia eu não sabia que ela era Rosa-partida. Aquele dia, eu somente vi uma Rosa-mulher fascinante que gostava de contar longas histórias sobre lugares desconhecidos... e as contava bem. E sabia disso. Tinha todo um gestual próprio: mãos agitadas que se movimentavam muito e, de quando em quando, passavam pelos cabelos lisos; olhar penetrante que fazia qualquer um prestar atenção ao que ela dizia. Quando falava, parecia que seu corpo todo falava.

Eu só via Rosa. Rosa via todo mundo e fingia não me ver. Uma hora Rosa parou... não que as histórias tivessem terminado, mas Rosa cansou. Olhei para os lados e só vi Rosa. Há mais de duas horas Rosa só falava pra mim. Na verdade, nossos amigos continuavam no bar, mas Rosa só falava pra mim. E eu que pensava que Rosa não me via.

Enfim, sentou-se à minha mesa, tomou do meu vinho e perguntou onde eu morava. Era perto. O bar fechou, fomos tomar mais um vinho lá em casa. Aí foi a minha vez de falar. Só que eu não tinha histórias para contar e, as poucas que tinha, não sabia contar como Rosa. Assim foi que o que deveria ser o meu monólogo transformou-se em uma entrevista de Rosa. Ela perguntava. Eu respondia. Sucinto, impactado pelo olhar de Rosa.

- Ah... então tu faz jornalismo?
- Sim.
- Trabalha com o que?
- Correção gramatical.
- E o que jornalismo tem a ver com isso?
- Nada.

Eu não conseguia responder. Rosa fascinava. Eu não. Não sei o que Rosa queria aquela noite. Nunca soube. Mesmo depois, ela nunca me disse. Mas eu queria Rosa. Não sei bem o porquê, mas sei que queria Rosa. O vinho começou a fazer efeito e eu queria Rosa cada vez mais. Mas Rosa dormiu. Ao meu lado na cama, Rosa-morfeu.

Passei a noite olhando Rosa. Não consegui dormir. Então Rosa acordou. Não disse palavra, só me olhou. No fundo ela sabia que eu não tinha conseguido dormir, inebriado pelo perfume de Rosa, pelo jeito de Rosa e pelas palavras de Rosa. E Rosa –que fascinou pelas palavras– calou. Correu as mãos pelo meu rosto e pousou-as sobre meus olhos. Deitou-se sobre mim e começou a sussurrar coisas eu não entendia. Beijou-me. Ah que beijo bom o de Rosa... macio e forte, decidido, molhado e doce. Eu nunca havia beijado uma mulher assim, mas era isso que queria desde o momento em que vira Rosa.

E Rosa continuou. Ela sabia o que fazia, sabia aonde ir e sabia que teria de me guiar. Como guiou pela Paris de suas histórias. Parecia que eu havia esperado toda a vida por Rosa, ou por aquela sensação, não sei. Meus sentimentos se confundiram e já não sabia o que era Rosa e o que era eu. Por alguns instantes meu corpo não me pertencia... mas era eu quem sentia. E Rosa gostou.

Então se vestiu. Não disse palavra. Deu-me um beijo, abriu a porta e foi embora a deixando entreaberta. Como se fosse voltar ou quisesse que eu a seguisse. E eu fiquei ali, parado, inerte, estático, totalmente tomado por Rosa e perdido por Rosa.

E nunca mais vi Rosa. E nunca mais soube de Rosa. E nunca mais soube de alguém que soubesse de Rosa. E nunca mais encontrei alguém como Rosa. Assim foi que eu conheci uma Rosa-partida que até hoje não sei se mudou sua vida por causa da minha. Mas, de vez em quando, algo me faz lembrar de Rosa e sinto tudo novamente.

Agora que consigo reconhecer a rotina dos dias em que penso em Rosa, aprendi a me preparar para eles. Mas já tiveram dias em que fui surpreendido ou sem o vinho, ou atendendo um telefonema bem naquela hora em que os pensamentos em Rosa estão se formando. Aí eles vão embora... Tiveram outros dias que começaram parecendo ser dias de pensar em Rosa, só que eu senti fome. E almocei. E aí percebi que o dia me enganou. Não era um dia de pensar em Rosa. Mas, às vezes, sou eu quem engana o dia. Já teve até uma quinta que eu acordei como nos dias de Rosa, então fingi que era domingo para ver se pensava em Rosa. E pensei.

Será que se fizéssemos convescotes a minha Rosa teria sido mais minha? Porque aí eu poderia pensar em Rosa todos os dias e não só nos dias de pensar em Rosa. Todo dia seria dia de Rosa. E, se nos tivéssemos encontrado mais uma ou duas vezes, talvez as manhãs chuvosas de quarta ou as noites quentes de segunda também fossem dias de pensar em Rosa.

SUGESTÃO: LEIA O SEGUNDO CONTO, OU NÃO...
MEMÓRIAS
Desejo a todos --o que me inclui-- muita sorte em 2010!!!! Tudo vai dar certo no final, se nao deu certo 'e porque ainda nao chegou ao fim! Frase-hino do otimistas de plantao, mas que est'a valendo para 2010!! Nao que eu acredite em amuletos da sorte, como o tal trevo que vai reproduzido abaixo. Mas ele simboliza socialmente a palavra sorte. Como eu desejo que ela seja 'muita'... posto uma foto beeem grande do tal trevo de quatro folhas! Hehehe!!

















[foto de Carla Rocha, dispon'ivel em http://br.olhares.com/trevo_da_sorte_foto2024393.html]
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